Uma das maiores contribuições sobre as origens das influências teológicas de outras tradições cristãs sobre os pioneiros do movimento pentecostal foi nos dada pelo pastor e teólogo José Gonçalves, em sua obra “A Glossolalia e a formação das Assembleias de Deus: Um Resgate Histórico da Soteriologia e Pneumatologia do Início do Movimento Pentecostal” (CPAD, 2022).
No presente texto, nos deteremos sobre alguns dos principais nomes do início do Movimento Pentecostal, em especial entre aqueles ligados ao pentecostalismo brasileiro, citando diretamente a obra de José Gonçalves, que em sua introdução já afirma:
“Do lado americano, por ter surgido do movimento de santidade metodista, as ADs americanas refletem majoritariamente o arminianismo wesleyano. Por outro lado, as ADs brasileiras, por virem da tradição batista, refletem com mais fulgor o arminianismo clássico. Isso, todavia, não significa dizer que as ADs brasileiras não tenham sofrido influência do wesleyanismo, porque os fatos históricos provam que sim. Na verdade, os batistas suecos sofreram influência do arminianismo desde a sua gênese. […] Com o propósito de mostrar o pano de fundo do arminianismo assembleiano brasileiro, que é herdado da tradição batista em primeiro lugar […]. A Assembleia de Deus brasileira, uma denominação filha dessa poderosa tradição protestante, espelha mais do que qualquer outra crença arminiana de que Deus ama a todos e por isso se converteu numa das mais poderosas forças missionárias da história do protestantismo.” (p. 15)
Desde o início do livro, fica evidente que a herança teológica (soteriológica) assembleiana brasileira é herdada principalmente do pensamento batista arminiano-wesleyano.
A Teologia Soteriológica de Gunnar Vingren
“No contexto batista sueco brasileiro, a soteriologia pentecostal tem forte herança Armínio-wesleyana. Isso pode ser mostrado em dois momentos diferentes. Em um primeiro momento, a presença dos pressupostos arminianos na teologia dos pioneiros suecos já existia na era pré-pentecostal. Esse fato é claramente ilustrado na exposição de aspectos arminianos feitos por Gunnar Vingren nos sus escritos mesmo antes de tornar-se um pentecostal. Posteriormente, esses pressupostos ganharão contornos wesleyanos bem definidos na teologia dos suecos em solo brasileiro”. (p. 413)
Como se pode perceber na citação acima, alguns aspectos do arminianismo e wesleyanismo influenciaram o pensamento soteriológico de Vingren.
A Teologia Soteriológica de Lewi Pethrus
“[…] em termos do arminianismo e da patrística oriental, “Pethrus insistia que cada indivíduo tinha a capacidade de escolher o curso da vida no presente e no futuro”. Nesse aspecto, o pensamento de Pethrus, segundo análise de Carlsson, gira em dois eixos principais. […] Carlsson (1990) observa que Pethrus afirmava estar ligado à tradição luterana, mas deixa claro que acredita que o ser humano tem liberdade para escolher o caminho moral e espiritual que ele quer. […] Assim sendo, fica claro que o pensamento de Pethrus expõe elementos do arminianismo clássico, mas também é inegável a presença de pressupostos do arminianismo mais popular no modelo de C. G. Finney. De fato, Pethrus diz ter sido grandemente influenciado por Finney quando leu a sua biografia em 1905.” (p. 415,416)
Pethrus, assim como Vingren, se enquadra no perfil soteriológico batista sueco e arminiano.
A Teologia Soteriológica de Nils Kastberg
“A soteriologia do missionário Nils Kastberg pode ser vista nos seus inúmeros comentários das Lições Bíblicas da EBD que ele escreveu quando aqui chegou. […] O posicionamento de Kastberg na defesa da queda da graça reflete claramente uma influência wesleyana no seu sistema teológico. A meu ver, os batistas escandinavos, na questão da doutrina da segurança eterna, distinguiam-se dos seus irmãos batistas-americanos devido à forte influência metodista-europeia que esteve presente entre os batistas escandinavos desde os primeiros anos de formação da denominação. […] Katsberg (1936, p. 23) já havia demonstrado familiaridade com a doutrina wesleyana quando, em 1936, de forma positiva refere-se a ela como “santificação verdadeira” (KASTBERG, Lição Bíblica, 7, 1936, p. 23). […] Assim não causa surpresa encontrar mais arminianismo na teologia de Kastberg.” (p. 420,425,426)
O pensamento soteriológico dos missionários escandinavos, com toda a influência que sofreu das tradições cristãs aqui citadas, contribuiu diretamente para a construção da soteriologia pentecostal assembleiana brasileira.
Tais fatos aqui expostos, além de muitos outros presentes na obra de Gonçalves, o levou à seguinte conclusão:
“Seja por qual vertente for, a Assembleia de Deus, portanto, é uma igreja pentecostal de matriz teológica Armínio-wesleyana. Essa química produziu uma igreja aberta aos carismas, comprometida com a herança da Reforma e apaixonada pela obra missionária” (p. 433)
Quando nos debruçamos sobre as Lições Bíblicas publicadas pela CPAD, as influências e os fundamentos teológicos de outras tradições cristãs sobre a teologia produzida por pentecostais é também evidente.
Na Lição Bíblica de 16 de fevereiro de 1936 (p. 23), já mencionada aqui, Nils Kastberg fez a seguinte citação: “Lutero veio e começou a cavar, na Bíblia, onde achou o poço chamado santificação pela fé. Wesley aí também cavou e achou a santificação verdadeira, sem conventos e sem formalidades. Os batistas cavaram e acharam água bastante, para batizar os crentes com o batismo bíblico. O povo pentecostal cavou e achou a fonte que se chama batismo no Espírito Santo, com os sinais bíblicos. Vamos, irmãos, cavar mais, pois acharemos, ainda, outros poços de água viva”.
Kastberg reconhece claramente e humildemente a importante contribuição de cada tradição cristã na construção da teologia ortodoxa, através da figura dos “poços cavados”.
Na Lição Bíblica de 7 de abril de 1974, comentada por Lawrence Olson, lemos acerca da doutrina da justificação: “Foi a descoberta desta doutrina por Lutero e sua divulgação que trouxe a Reforma à Igreja” (p. 773).
E ainda, na lição de 2 de junho: “Ao estudar o livro de Romanos, Lutero descobriu a grande verdade que ‘o justo viverá da fé’. […] Para todos nós esse movimento da Reforma foi muito importante, pois devolveu à Igreja a doutrina fundamental da justificação pela fé. Sem ela estaríamos no mesmo erro dos séculos de obscurantismo e em grave perigo de perder as nossas almas” (p. 809).
Na lição bíblica de 14 de abril, sobre a “eleição”, lemos: “Em torno do assunto da eleição têm surgido duas escolas de pensamento: os calvinistas, que seguem os pensamentos do “grande reformador” João Calvino e os arminianos, que seguem os pensamentos de Jacó Armínio, outro teólogo holandês. […] os metodistas, episcopais e luteranos acompanham Armínio. Nós, das Assembleias de Deus, também somos da opinião de Armínio.” (p. 775)
Como tenho dito, o pentecostalismo clássico assembleiano brasileiro tem sim, raízes teológicas na Reforma Protestante e nos desdobramentos da mesma, e os nossos pioneiros assim entendiam.
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