Os problemas presentes nas novas versões bíblicas, com ênfase na Nova Almeida Atualizada (NAA), referem-se basicamente aos manuscritos gregos alexandrinos (principalmente os Códices Sinaítico e Vaticano) e ao texto crítico-eclético-ecumênico de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB), e envolve omissões, acréscimos, alterações, erros textuais e incoerências metodológicas.

1 – O que são versões bíblicas?

Versões bíblicas são traduções da Bíblia feitas em diferentes idiomas e formatos (formais ou literais e dinâmicas ou funcionais). A escolha e uso de uma versão bíblica tem impacto direto na interpretação, exposição e aplicação das Escrituras.

2 – Quais são as versões bíblicas disponíveis no Brasil e suas principais características?

a) As versões antigas ou tradicionais: Almeida Revista e Corrigida (ARC), Almeida Corrigida Fiel (ACF) e King James 1611.

– O Novo Testamento é traduzido do Textus Receptus, um texto grego baseado em manuscritos gregos bizantinos (90-95% dos mss), cuja a primeira edição foi publicada por Desidério Erasmo, impressa em Basle (Basileia), Suiça, em 1516. Esse texto, em suas várias edições, serviu de base para diversas traduções da Bíblia, como a Bíblia de Lutero (1522/1534), a Bíblia Rei Tiago ou King James (1611) e para a maioria das traduções do Novo Testamento da Reforma Protestante, inclusive a tradução portuguesa por João Ferreira de Almeida (1681).

b) As versões modernas: Almeida Revista e Atualizada (ARA), Nova Almeida Atualizada (NAA), Nova Versão Internacional (NVI), Nova Versão Transformadora (NVT), Almeida Século 21 (A21), Nova Tradução na Linguagem de Hoje (NTLH), etc. Além dessas, classificadas como evangélicas, foram publicadas no Brasil as seguintes versões católicas romanas: A Bíblia de Jerusalém, Bíblia do Peregrino, Bíblia Sagrada Ave Maria, Bíblia Sagrada Scribere, Bíblia Sagrada Edição Pastoral, etc. Enquadra-se também como uma versão moderna a Tradução do Novo Mundo das Escrituras Sagradas (Sociedade Torre de Vigia de Bíblias e Tratados), das Testemunhas de Jeová.

– O Novo Testamento é traduzido de O Novo Testamento Grego (Sociedades Bíblicas Unidas/Sociedade Bíblica do Brasil), um texto grego baseado principalmente em manuscritos gregos alexandrinos (5 a 10% dos mss), com destaque para os Códices Sinaítico e Vaticano. A sua primeira edição foi publicada em 1966, em língua inglesa, produzida por uma Comissão Editorial internacional. Antes do lançamento da segunda edição (1968), Carlo Maria Martini (1927-2012), um jesuíta da ala liberal do catolicismo romano, reitor do Pontifício Instituto Bíblico de Roma e posteriormente arcebispo de Milão e Cardeal, passou a integrar a Comissão Editorial. Em 1968 foi aprovado um acordo de cooperação ecumênica para a tradução da Bíblia entre as Sociedades Bíblicas Unidas e o Vaticano, acordo esse ratificado em 1987. O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) tornou-se assim o único texto grego que serve oficialmente de base para as traduções do Novo Testamento feitas pelas Sociedades Bíblicas Unidas (e suas afiliadas), e para as traduções feitas pela Igreja Católica.

– Os defensores e promotores de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) e das novas versões bíblicas, afirmam que os manuscritos bizantinos, e consequentemente os textos gregos e versões bíblicas deles derivados, não são os mais próximos do texto bíblico original (autógrafos).

– Os Códices Sinaítico e Vaticano, manuscritos alexandrinos considerados por alguns eruditos como “os mais antigos e melhores”, e principal base textual de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB), divergem entre si mais de 3.000 vezes somente nos evangelhos. Esses manuscritos omitem milhares de palavras, vários versículos e passagens bíblicas inteiras, sob a alegação de que essas palavras foram acrescentadas pelos escribas nos manuscritos bizantinos.

– Nas páginas de apresentação de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB), lemos: “Os colchetes duplos dentro do texto indicam que as passagens ali incluídas, geralmente trechos mais extensos, reconhecidamente não fazem parte do texto original, mas foram acrescentadas ao texto bíblico num dos primeiros estágios da tradição textual” (p. XVII).

– Nas páginas de apresentação da versão Nova Almeida Atualizada (NAA), lemos: “Diversos textos no Novo Testamento aparecem entre colchetes. Trata-se de material que se encontra no aparato crítico das edições mais recentes do texto grego, não sendo, portanto, considerado parte do original. Esse material foi mantido no texto da tradução, ainda que entre colchetes, para que o leitor não estranhasse a falta de alguns versículos, pensando inclusive que poderia ter havido uma falha na impressão.” (p. VII).

Quadro Descritivo com Alguns Casos de Versículos Omitidos em O Novo Testamento Grego Presentes na Maioria dos Manuscritos Gregos

TextoCódice Sinaítico/VaticanoNova Almeida AtualizadaManuscritos Gregos que Contém
Mt 17.21omitemcolchetes99%
Mt 18.11omitemcolchetes (ver ARA)98%
Mt 23.14omitemcolchetes97%
Mc 7.16omitemcolchetes99%
Mc 9.44omitemcolchetes96%
Mc 9.46omitemcolchetes96%
Mc 11.26omitemcolchetes96%
Mc 15.28omitemcolchetes89%
Mc 16.9-20omitemcolchetes95%
Lc 23.17omitemcolchetes98%
Jo 5.4omitemcolchetes99%
Jo 7.53-8.11omitemcolchetes (ver ARA)85%
At 28.29omitemcolchetes95%
Rm 16.24omitemcolchetes97%

Quadro Descritivo com Alguns Casos de Versículos Parcialmente Omitidos em O Novo Testamento Grego Presentes na Maioria dos Manuscritos Gregos

TextoNova Almeida AtualizadaCódice Sinaítico/VaticanoManuscritos Gregos que Contém
Mt 5.44Omite “bendizei os que vos maldizem, fazei bem aos que vos odeiam”omitem91%
Mt 20.22Omite “e ser batizados com o batismo com que eu sou batizado?”omitem99%
Mt 25.13Omite “em que o Filho do Homem há de vir”omitem89%
Mc 6.11Omite “Em verdade vos digo que haverá mais tolerância no Dia do Juízo para Sodoma e Gomorra do que para os daquela cidade”omitem98%
Mc 7.8Omite “como o lavar dos jarros e dos copos, e fazeis muitas outras coisas semelhantes a estas.”omitem98%
Mc 10.24Omite “para os que confiam nas riquezas”omitem92%
Lc 1.28Omite “bendita és tu entre as mulheres.”omitem99%
Lc 9.56Omite “Porque o Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las.”omitem73%
Lc 11.4Omite “mas livra-nos do mal.”omitem99%
Jo 16.16Omite “porquanto vou para o Pai.”omitem79%
At 10.30Omite “estava eu em jejum”omitem95%
Rm 8.1Omite “que não andam segundo a carne, mas segundo o espírito”omitem94%
1 Co 6.20Omite “e no vosso espírito, os quais pertencem a Deus.”omitem96%

3 – Alguns problemas textuais nos manuscritos alexandrinos e em O Novo Testamento Grego (SBU/SBB)

Além das muitas palavras e versículos omitidos, entre alguns outros problemas textuais presentes em O Novo Testamento Grego (SBU/SBB), destacamos as questões abaixo:

– Mateus 1.7,8,10: Coloca Asafe (2% dos MSS) na genealogia de Jesus em lugar de Asa (98% dos MSS). Coloca Amós (2% dos MSS) na genealogia de Jesus em lugar de Amon/Ammon (98% dos MSS). A NAA corrige (esconde) esses erros em seu texto. A justificativa que os editores de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) deram para manter os erros em Mateus 1.7,8,10 foi que: “[…] já que o evangelista pode ter derivado material para a genealogia, não diretamente do AT, mas das subsequentes listas genealógicas, onde ocorria a soletragem errada, a comissão não viu razão para adotar o que parece ser uma emenda escribal” (METZGER, Bruce M. Un comentário textual al Nuevo Testamento griego. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft/German Bible Society, 2006, p. 1,2), ou seja, o evangelista Mateus pode ter cometido erros nesses versículos, e por estarem supostamente presentes no texto original (e nos Códices Sinaítico e Vaticano), eles decidiram mantê-los. Para esses editores, alguns copistas corrigiram esses supostos erros de Mateus nas cópias (emenda escribal).

– Mateus 27.24. Omite a palavra “justo” (99% dos MSS, inclusive o Códice Sinaítico). Além de não seguir o texto crítico-eclético-ecumênico das SBU/SBB, a NAA traduz por “homem” em lugar de “justo”. A omissão de “justo” é defendida pelos editores (METZGER, ibid., p. 56,57) por não constar nos supostos “melhores representantes dos textos alexandrino, ocidental e cesareno” (1% dos MSS).

– Marcos 1.2: Coloca “na profecia de Isaías” no lugar de “os profetas” (97% dos MSS). A primeira parte da citação da profecia é de Malaquias 3.1. A NAA reproduz esse erro. Os editores rejeitaram 97% dos MSS, mantendo o erro que se encontra nos Códices Sinaítico e Vaticano (METZGER, ibid., p. 63).

– Marcos 6.22: O texto diz “a filha dele” (3% dos MSS). A NAA corrige (esconde o erro) para “a filha de Herodias” (97% dos MSS). Sobre manter o erro textual “a filha dele”, apesar do contexto ser favorável para “a filha de Herodias” (Mc 6.24), a maioria dos integrantes da comissão editorial resolveu que a forma “dele” deveria ser adotada, com base no “sólido apoio externo” (3% dos MSS), ou seja, nos problemáticos Códices Sinaítico, Vaticano e seus aliados (METZGER, ibid., p. 77).

– Marcos 7.24: Omite “e Sidom” (99% dos MSS). A NAA insere “e Sidom”, corrigindo (escondendo) o erro. Sobre a omissão de “e Sidom” em Marcos 7.24, não seguindo inclusive os Códices Sinaítico e Vaticano, os editores alegaram que parecia ser uma assimilação de Mateus 15.21 e Marcos 7.31 feita pelos copistas (METZGER, ibid., p. 82), e por isso adotaram a forma mais breve (1% dos MSS).

– Lucas 4.44: Coloca “Judeia” (4% dos MSS) em lugar de “Galileia” (96% dos MSS). Ver as passagens paralelas de Mateus 4.23 e Marcos 1.39. A NAA reproduz esse erro. No caso de Lucas 4.44 (METZGER, ibid., p. 114,115), os editores alegam que a forma Ἰουδαίας (Judeia) é a mais difícil, e por razões metodológicas adotaram essa forma errada, alegando mais uma vez que os copistas corrigiram-na para Γαλιλαίᾳς (Galileia).

– Lucas 23.34: Os editores colocam entre colchetes duplos a primeira parte do versículo: “E dizia Jesus: Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem” (99% dos MSS), negando assim a originalidade dessas palavras. A NAA não coloca essas palavras entre colchetes e nem as omite, deixando de considerar mais uma vez a sua base textual de tradução. Ao omitir a primeira parte do versículo, os editores de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) alegaram a ausência dessas palavras em testemunhos antigos e diversos (cerca de 13 MSS, o que representa apenas 0,8% dos MSS), e que foi incorporada por copistas desconhecidos relativamente cedo na transmissão do terceiro evangelho (METZGER, ibid., p. 154).

– Lucas 24.53: A NAA não segue O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) que omite “louvando” (99,6% dos MSS), ao mesmo tempo em que omite “e bendizendo” (99,6% dos MSS), presente em O Novo Testamento Grego (SBU/SBB). A NAA omite também “amém” (98% dos MSS). Temos aqui um problema triplo em um único versículo. Apesar das evidências que trazem “louvando” e “Amém”, os editores (METZGER, ibid., p. 164) mais uma vez se fundamentaram nos mais antigos (e complicados manuscritos).

– Judas 15: A NAA muda a tradução para “ímpios” (ἀσεβεῖς, asebeis), presente em 96% dos MSS, não seguindo o texto de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) onde a palavra é “alma” (ψυχὴν, psichēn), mais uma vez corrigindo (ou escondendo) problemas textuais que se encontram no texto grego que é a base da sua tradução. A opção por “alma” (ψυχὴν, psichēn) em lugar de “ímpios” (ἀσεβεῖς, asebeis) não é justificada pelos editores nos comentários escritos por Metzger. O aparato crítico de O Novo Testamento Grego (SBU/SBB) aponta para o fato de que eles preferiram seguir o Códice Sinaítico (e outros poucos MSS), que aqui diverge mais uma vez do Códice Vaticano.

Onde ficam nesses casos, por exemplo, as doutrinas da inspiração e da inerrância da Bíblia Sagrada?

Considerações Gerais

Como fica evidente nos quadros e exemplos aqui expostos, a NAA e a ARC são incompatíveis (não dizem a mesma coisa, entram em conflito) em diversas passagens onde diferem textualmente entre si, tendo o leitor ou expositor bíblico que decidir por uma das versões.

As aproximações e distanciamentos da NAA do texto grego (O Novo Testamento Grego, quinta edição revisada, SBU/SBB) de onde parte a sua tradução do Novo Testamento, atestam os problemas desse texto grego crítico-eclético-ecumênico, baseado principalmente em uns poucos manuscritos gregos alexandrinos que conflitam muito entre si, e com a própria NAA.

A Nova Almeida Atualizada (NAA) pode até ter uma linguagem mais contemporânea e trazer em algumas passagens do Novo Testamento uma melhor tradução, mas pelas razões aqui expostas, não a indico como substituta da Almeida Revista e Corrigida (ARC).

O Textus Receptus, e consequentemente outras representações do texto grego bizantino (Texto Majoritário, O Novo Testamento Grego Segundo a Família 35, etc.), base principal da tradução do Novo Testamento Almeida Revista e Corrigida (ARC), continuam tendo o seu devido valor e importância, e por essa tradição textual (e pelas versões bíblicas antigas e tradicionais) devemos louvar a Deus, o autor e preservador das Escrituras Sagradas.

Até que novas descobertas arqueológicas de manuscritos gregos do Novo Testamento aconteçam, mudando substancialmente o atual cenário da manuscritologia, a minha opção é pela grande tradição textual bizantina (90-95% dos manuscritos gregos), representada principalmente pelo Textus Receptus (Beza-Scrivener), Texto Majoritário (Hodges-Farstad) e O Novo Testamento Grego Segundo a Família 35 (Wilbur N. Pickering).

Referências Bibliográficas

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ANGLADA, Paulo. Manuscritologia do Novo Testamento: História, Correntes Textuais e o Final do Evangelho de Marcos. Ananindeua, PA: Knox Publicações, 2014.

BURGON, John William. The Last Twelve Verses of the Gospel According to S. Mark: Vindicated against Recent Critical Objectors and Established. Oxford and London: James Parker and Co. 1871. Edição do Kindle.

CLOUD, David. Versões modernas da Bíblia. Rio Branco, AC: Editora Literatura Batista, 2021.

GERMANO, Altair. Manuscritos do Novo Testamento: introdução à manuscritologia e um estudo comparativo entre as versões bíblicas ARC e NAA.

HOSKIER, H. C. Codex B and its allies: a study and an indictment. London: Bernard Quaritch, 1914. V. 2.

O Novo Testamento Grego. Quinta edição revisada. Barueri, SP: Sociedade Bíblica Alemã; Sociedade Bíblica do Brasil, 2018.

GOMES, Paulo Sérgio; OLIVETTI, Odayr. Novo Testamento Interlinear analítico: texto majoritário com aparato crítico grego-português. 2.ed. São Paulo: Cultura Cristã, 2015.

METZGER, Bruce M. Un comentário textual al Nuevo Testamento griego. Stuttgart: Deutsche Bibelgesellschaft/German Bible Society, 2006.

PICKERING, Wilbur N. O Novo Testamento Grego Segundo a Família 35: texto grego e aparato crítico. Brasília: Os Semeadores, 2021.

PICKERING, Wilbur Norman. Como identificar a redação original do Novo Testamento. Brasília: Clube de Autores, 2024.

REIS, Aníbal Pereira dos. A Bíblia traída: análise crítica e clamor de alerta. São Paulo: Edições Caminho de Damasco, 1976.

SNAPP Jr., James. Evidências da autenticidade de João 7.53-8.11. UICLAP, 2021.

SNAPP Jr., James Edward. É eclético?: Um exame do texto base “eclético e racional” da Nestlé-Aland do Novo Testamento. Frankton, Indiana EUA, 2023. Edição do Kindle.

The New Testament: the greek text underlying the english authorised version of 1611. London, England: Trinitarian Bible Society, 2022.

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