Em nossa exposição enfatizaremos os sistemas de governos que estão associados à nação de Israel, eleita por Deus para ser um canal de bênçãos para as demais nações (Gn 12.3; Êx 19.3-6; Is 49.5-6). Iniciaremos pelo sistema patriarcal.

A era patriarcal, de forma mais específica, refere-se ao período da história de Israel relativo aos fundadores Abraão, Isaque e Jacó. Os patriarcas tiveram experiências pessoais com Deus, que se revelou a cada um deles (Gn 12.1-3; 26.24-25; 35.1; 9-15). No sistema patriarcal o pai era o chefe ou cabeça da família. Segundo Champlin:

Também era o seu sumo sacerdote, responsável por dirigir devidamente os ritos e costumes da fé religiosa. O pai estendia sua autoridade sobre outras famílias, como um autêntico patriarca. Seu filho mais velho vinha a substituí-lo, quando falecia. Esse filho era o herdeiro da posição e das propriedades de seu pai. Se não houvesse herdeiros, um filho adotado (mesmo que tivesse sido um escravo), podia tornar-se o herdeiro (ver Gn 15.2 ss). Além disso, um filho nascido de uma concubina, talvez a escrava da esposa legítima, poderia vir a ser o herdeiro, na ausência de filhos da esposa principal (Gn 16.2). Mas, se no decorrer dos anos, nascesse um filho à esposa principal, a questão era revertida, e esse filho vinha a ser o futuro chefe do clã (Gn 15.4; 17.19). A poligamia complicava os laços familiares; mas os filhos de diferentes esposas eram identificados mediante o uso do nome materno. Os trechos de Gênesis 16.4; 29.23,24,28,29 mostram quão comum era essa forma de matrimônio.[1]

Os patriarcas viviam em estilo seminômade, nas terras do chamado Crescente fértil. As viagens eram uma constante.[2] No contexto do patriarcado, ganha destaque aqui o fato de um hebreu se tornar governador do Egito. Seu nome, José.

José foi o décimo primeiro filho do patriarca Jacó. Ele foi um instrumento de Deus Para preservação e prosperidade de sua família e povo no Egito, durante uma época de fome na terra de Canaã. Foi em razão da posição política que José veio a exercer, que cerca de 400 anos mais tarde o povo hebreu passou à condição de nação, após o Êxodo.[3] 

Um terço do livro do Gênesis trata de episódios que envolvem a vida de José (Gn 37-50). Os principais são: (a) os relatos dos sonhos de José, que evidenciam um plano de Deus para que ele viesse a alcançar a posição política que alcançou (Gn 37.1-11); (b) a trama de seus irmãos, que resultou na sua venda para mercadores ismaelitas e ida para o Egito (Gn 37.12-28); (c) o assédio e calúnia sofridos na casa de Potifar, eunuco de Faraó, que resultou em sua prisão (Gn 39.1-20); (d) a interpretação dos sonhos do copeiro e do padeiro do rei do Egito (Gn 40.1-23); (e) a interpretação do sonho de Faraó e o conselho dado ao mesmo (Gn 41.1-37); (f) José é posto por Faraó como governador sobre toda a terra do Egito (Gn 41.38-57); (g) o reencontro com a sua família (Gn 42-47) e; a morte de Jacó e José (Gn 48-50).

A função de José como governador do Egito pode ser comparada à de um “grão-vizir” ou “supervisor dos estados reais”, ambas encontradas em documentos egípcios. Conforme lemos no Comentário Histórico-Cutural da Bíblia

Tal posição é detalhada em pinturas de túmulos egípcios, em que se mostra toda a sequência de eventos, desde a obtenção do título até a colocação de vestes e anéis no funcionário nomeado pelo faraó. José atua mais ou menos como “supervisor dos silos do Alto e Baixo Egito”. Era raro um estrangeiro ocupar esse tipo de cargo antes do período dos HICSOS (1750-1550 a.C.), quando um grande número de semitas serviu no Egito. […] Reis e administradores reais usavam um anel-selo para selar os documentos oficiais. Esse anel era distintivo e continha o nome (emblema, no Egito) do rei. Qualquer pessoa que o usasse estaria agindo em nome do rei (veja Nm 31.50; Et 3.10; Tb 1.20; 1 Mc 6.15). A corrente de ouro e as vestes de linho fino eram dadas na cerimônia de posse, fornecendo ao nomeado os acessórios que demonstravam seu status, posição e função.[4]

Apesar da alta posição política que veio a ocupar, José permaneceu crente e humilde, reconhecendo que tudo o que tinha alcançado foi através da bênção do Senhor sobre a sua vida, e em razão do plano de Deus para o seu povo:

E José disse aos seus irmãos: — Agora cheguem perto de mim. E eles chegaram. Então ele disse: — Eu sou José, o irmão de vocês, que vocês venderam para o Egito.

Agora, pois, não fiquem tristes nem irritados contra vocês mesmos por terem me vendido para cá, porque foi para a preservação da vida que Deus me enviou adiante de vocês.

Porque já houve dois anos de fome na terra, e ainda restam cinco anos em que não haverá lavoura nem colheita.

Deus me enviou adiante de vocês, para que fosse conservado para vocês um remanescente na terra e para que a vida de vocês fosse salva por meio de um grande livramento.

Assim, não foram vocês que me enviaram para cá, e sim Deus, que fez de mim como que um pai de Faraó, e senhor de toda a sua casa, e como governador em toda a terra do Egito.[5]

Assim como no caso de José, Deus pode em todas as épocas, pelas vias corretas, levantar do meio do seu povo lideranças políticas relevantes para a sociedade.

A era patriarcal cobriu o período de cerca de 1900 a 1600 a.C.[6]


[1] CHAMPLIN, R. N. Enciclopédia de Bíblia, teologia e filosofia. V. 5. São Paulo: Hagnos, 2001, p. 113.

[2] Ibid., p. 112.

[3] GARDNER, Paul (E.). Quem é quem na Bíblia Sagrada: a história de todas as personagens da Bíblia. Tradução de João Ribeiro. São Paulo: Editora Vida, 2005, p. 377.

[4] WALTON, John H.; MATTHEWS, Victor H.; CHAVALAS, Mark. W. Comentário histórico-cultural da Bíblia: Antigo Testamento. Tradução de Noemi Valéria Altoé da Silva. São Paulo: Vida Nova, 2018, p. 90-91.

[5] Gênesis 45.4-8.

[6] DOUGLAS, J. D. (E.). O novo dicionário da Bíblia. Tradução de João Bentes. São Paulo: Vida Nova, 1988, p. 1213.

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