https://youtu.be/qk2ZVgv4Xic

Os fundamentos da Teologia da Missão Integral (TMI) estão intimamente associados aos ideais da Teologia da Libertação (TL). Sua ênfase numa “teologia contextual”, numa postura anticapitalista e antiamericana,[1] no ecumenismo,[2] no alinhamento com o pensamento político de Paulo Freire (educador socialista),[3] na ideia de uma “preferência” ou “preocupação especial” de Jesus em relação aos pobres, temas norteadores da Teologia da Libertação,[4] além da declaração aberta de alguns dos seus defensores da leitura da realidade social pelas “lentes” ideológicas do marxismo,[5] provam isso claramente.

Historicamente, a Teologia da Missão Integral surge no mesmo período do nascimento da Teologia da Libertação, ou seja, durante os anos 60 e início da década de 1970. Conforme Paddila, um evento significativo deste despertar aconteceu no 1º Congresso Latino-Americano de Evangelização (CLADE 1), que foi realizado em Bogotá, Colômbia, em novembro de 1969, onde Samuel Escobar, membro da equipe de obreiros da Comunidade Internacional de Estudantes Evangélicos (CIEE), falou sobre “A responsabilidade social da igreja”.[6] Para Sanches, o Movimento de Missão Integral teve sua origem, de forma mais precisa, no contexto da FTL – Fraternidade Teológica Latino-americana (criada em 1970 na cidade de Cochabamba, Bolívia).[7] No caso da Teologia da Libertação, um primeiro esboço da mesma foi apresentado por Gustavo Gutiérrez, num breve ensaio intitulado Apuntes para uma teologia de la liberación, em Lima, no ano de 1969.[8]

A tentativa de diferenciar a Teologia da Missão Integral da Teologia da Libertação é tema constante entre os promotores da primeira. Uma crítica de Padilla, por exemplo, afirma:

Sob o título “evangelização e ultramundanalidade”, na terceira seção de minha palestra, falo também de posições extremas com relação ao mundo presente. Uma concebe a salvação como algo que se enquadra dentro da era presente em termos de libertação social, econômica e política. Eliminam-se ou reduzem-se as dimensões pessoais da salvação, o indivíduo se perde na sociedade. Não há lugar, ou há muito pouco, para o perdão da culpa e dos pecados, ou para a ressurreição do corpo e a imortalidade. Este mundo é o único que existe e a missão fundamental da igreja deve, portanto, ser concebida como a transformação deste mundo por meio da política. […] Por um lado, o evangelho não pode ser reduzido a categorias políticas, sociais e econômicas, nem a igreja uma agência de promoção humana. Menos ainda confundir o evangelho com uma ideologia ou a igreja com um partido político.[9]

René Padilla (1932-2021), fazendo alusão a Gustavo Gutiérrez, considerado o pai da Teologia da Libertação, escreveu:

Com mais exatidão, diríamos que a igreja na América Latina é uma igreja sem reflexão teológica própria. […] A análise de todos os aspectos de nossa realidade eclesiástica mostrará que nossa “dependência teológica” é tão real e tão forte como a dependência econômica que caracteriza os países do Terceiro Mundo. É bem verdade que os últimos viram o surgimento de um movimento teológico na América Latina que transbordou as fronteiras deste continente. Gustavo Gutiérrez, Hugo Assmann, Juan Luis Segundo e José Miranda (todos eles autores católico-romanos) são nomes já familiares a muitos leitores na Europa e na América do Norte. […] Uma fotocópia de alguma teologia elaborada na Europa ou na América do Norte jamais poderá satisfazer as necessidades teológicas da igreja no Terceiro Mundo. […] [10]

Padilla, na busca de justificativas para a criação de uma teologia contextual protestante, argumentou que os teólogos católico-romanos tinham um volume de produção literária pequeno, e um impacto muito limitado para alterar o quadro da dependência teológica das igrejas na América Latina. Afirmou ainda: “Que mesmo que um setor das igrejas protestantes, na falta de uma teologia própria com a qual encarar a tarefa de contextualizar o evangelho, tenha abraçado sua teologia, é altamente duvidoso que esta chegue a transcender amplamente o reduzido grupo de seus seguidores católico-romanos”.[11]

Sanches, ao discorrer sobre as teologias latino-americanas, também chamada de Teologias Contextuais, afirma que as mesmas se apresentam nas formas atuais da Teologia da Libertação e da Teologia da Missão Integral. As teologias da Libertação teriam definido o contexto socioeconômico latino-americano como lugar teológico a partir e para o qual fariam teologia.[12]

Ao falar sobre alguns aspectos históricos do progressismo evangélico, Ariovaldo Ramos e Nilza Zacarias afirmaram que:

“Jovens crentes, contrariando as determinações de seus pastores, começaram a expressar sua fé em praças públicas. Não havia conteúdo ideológico, mas havia contestação. E pela contestação veio a ideologia, fomentada no ambiente de censura. Daí nascem organizações paraeclesiásticas, fazendo a ponte entre a cultura e a igreja. São esses grupos que assumem os fragmentos das teologias libertadoras que os evangélicos discutiam antes do golpe militar, e que foram transferidas para o arraial católico. Dessa discussão surge a base para a Teologia da Missão Integral, uma variante protestante da Teologia da Libertação.” [13]

Sim, a Teologia da Missão Integral e a Teologia da Libertação estão estreitamente ligadas ao progressismo político e teológico.


[1] PADILLA, C. René. Missão integral: o reino de Deus e a igreja. Tradução de Emil Albert Sobottka e Wagner Guimarães. Viçosa, MG: Editora Ultimato, 2014, p. 129, 151-153, 162-164, 167.

[2] PADILLA, C. René. O que é missão integral? Viçosa, MG: Ultimato, 2009, p. 129-132.

[3] CAPELLETI, Paulo. Encontros das teologias latino-americanas: análise histórico-teológica da teologia da missão integral versus teologia da libertação. São Paulo: Descoberta, 2019, p. 59-62.

[4] Ibid., p. 196-204.

[5] Disponível em: https://youtu.be/qk2ZVgv4Xic

[6] PADILLA, ibid., p. 17,18.

[7] SANCHES, Regina Fernandes. Como fazer Teologia da Missão Integral. São Paulo: 2016, p. 18.

[8] MONDIN, ibid., p. 66.

[9] PADILLA, ibid., p. 80,81.

[10] PADILLA, ibid., p. 129,137.

[11] PADILLA, ibid., p. 129.

[12] SANCHES, ibid., p. 15.

[13] Candidatos Evangélicos: eleitorado em nome de Deus. Disponível em: https://diplomatique.org.br/candidatos-em-nome-de-deus/?fbclid=IwAR0Y23oLQT4HOI5-Oc9nhm6QVVWXOdtkI7yxNYrNgxZymdQ1lpwmgs-Eo7A, acesso em 18/7/2023.

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